![]() Caminho Mais Difícil
Eu me lembro do primeiro dia em que vi Luiza. Ela estava na varanda do café, com um livro nas mãos e os olhos perdidos nas páginas, como se o mundo ao redor simplesmente não existisse. Eu não acredito em amor à primeira vista, mas acredito em reconhecimento — e naquele momento, algo dentro de mim disse: "É ela." Nosso amor foi fácil no começo. Luiza tinha uma risada que fazia o tempo parar, e eu, um jeito teimoso de achar graça nas coisas mais simples. Nós nos completávamos de um modo que eu nunca tinha experimentado antes. Ela era arte e sensibilidade; eu, lógica e proteção. E, no meio disso tudo, havia uma paixão que queimava sem nos consumir — apenas nos aquecia. Até que o diagnóstico chegou. AIDS. A palavra ecoou na sala do médico como um tiro. Luiza ficou imóvel, os dedos entrelaçados nos meus, gelados. Eu olhei para ela e vi o medo — não só da morte, mas de me perder. De eu a abandonar. Nao importava como ela adquiriu a doença. Era mais consolador que nosntempos atuais a qualidade de vida é bem melhor para o acidente que se trata. E eu não tinha sido contaminado. — Você não está sozinha — eu disse, minha voz mais firme do que eu me sentia. Mas as noites que se seguiram foram silenciosas. Luiza se afastava, mesmo quando eu a puxava para perto. Ela começou a criar barreiras, como se eu fosse um intruso em sua dor. — Você deveria ir embora — ela sussurrou uma noite, de costas para mim na cama. — Não. — Eu não quero você aqui por pena. Eu virei ela para mim, segurando seu rosto entre as mãos. — Você acha que eu ficaria por pena? — minha voz falhou. — Eu fico porque te amo. Porque não existe lugar no mundo onde eu queira estar que não seja ao seu lado. Ela chorou então, um choro que vinha de um lugar tão fundo que doía só de ouvir. — Eu tenho medo, Germano. Medo de você me ver definhar. Medo de ser um fardo. — E eu tenho medo de viver sem você — respondi. — Mas eu escolho ficar. Todos os dias, eu escolho ficar. E foi isso que fizemos. Escolhemos o caminho mais difícil, o do enfrentamento, da dor compartilhada, das noites de insônia e dos dias de pequenas vitórias. A AIDS não definiu nosso amor — apenas nos mostrou o quanto éramos capazes de lutar por ele. Luiza ainda ri, ainda lê seus livros na varanda. E eu ainda a observo, sabendo que o tempo que temos é precioso, mas que nenhum segundo foi desperdiçado. Porque no fim, o amor não é sobre quantos dias temos, mas sobre quanta vida colocamos neles. E nós, nós vivemos cada um deles como se fosse eterno. Ana Pujol
Enviado por Ana Pujol em 08/04/2025
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