Refúgio entre quatro paredes
Tiago entrou em seu apartamento, fechando a porta atrás de si com um suspiro profundo. O som do clique da fechadura ecoou como um selo de proteção, afastando o mundo lá fora. O espaço era pequeno, mas para ele, era um santuário. As paredes eram pintadas de um azul suave, que lembrava o céu em um dia de verão, e a luz do sol filtrava-se pelas cortinas brancas, criando padrões dançantes no chão de madeira. O aroma do café fresco ainda pairava no ar, uma lembrança do que havia preparado horas antes. Tiago se dirigiu à cozinha, onde serviu-se com uma caneca que o esperava na mesa. Em suas mãos, sentiu o calor suave se espalhar por seus dedos, aquecendo não apenas suas mãos, mas também seu espírito. O gosto amargo e encorpado do café despertava suas ideias e trazia conforto em momentos de solidão. No canto da sala, havia uma estante repleta de livros—não apenas os que adorava ler, mas também aqueles que ele mesmo havia escrito. As lombadas coloridas se erguiam como amigos silenciosos, prontos para oferecer companhia nas noites em que a solidão se tornava palpável. Tiago passou os dedos pelas capas, sentindo a textura dos livros e lembrando das histórias que o transportaram para outros mundos. Cada título era uma janela aberta para novas realidades e, agora, cada um deles era também um pedaço dele mesmo. O sofá desgastado estava coberto por uma manta azul que sua avó lhe dera. O toque macio da lã contra sua pele trazia à tona memórias de tardes passadas ao lado dela enquanto ela contava histórias sobre sua infância—um amor pela narrativa que ele herdara. Era como se a manta estivesse abraçando-o, protegendo-o das incertezas da vida lá fora. Do lado oposto da sala estava uma pequena planta em um vaso simples. As folhas verdes brilhantes pareciam vibrar sob a luz suave do sol. Tiago a regava religiosamente e observava-a crescer dia após dia; era um símbolo de esperança para ele. Mesmo nas épocas mais sombrias, a vida sempre encontrava uma maneira de florescer—assim como suas ideias ao escrever. Enquanto caminhava até a janela, Tiago abriu as cortinas com cuidado. A vista da cidade se espalhava à sua frente—edifícios altos e ruas movimentadas pareciam distantes e irreais naquele momento. O som dos carros e das vozes se misturava em um murmúrio quase musical. Ele respirou fundo, sentindo o ar fresco entrar nos pulmões; era um lembrete de que ali dentro tudo estava sob seu controle. A luz do pôr do sol começou a invadir o apartamento, tingindo as paredes com tons dourados e laranjas. Tiago sentou-se no sofá e observou esse espetáculo diário com gratidão. A mágica daquele momento parecia transformar seu refúgio em algo sagrado—um espaço onde ele poderia ser verdadeiramente ele mesmo e deixar fluir as palavras que habitavam sua mente. A noite chegou lentamente e Tiago acendeu uma vela aromática na mesa lateral. O cheiro doce de baunilha começou a preencher o ambiente, criando uma atmosfera acolhedora e convidativa. Ele pegou seu caderno favorito—com páginas amareladas pelo tempo e anotações rabiscadas—e começou a escrever; cada palavra fluía como um bálsamo para sua alma inquieta. O toque do celular quebrou a solitude do ambiente, era um amigo de Tiago para contar-lhe sobre a morte trágica do avô enquanto passeava de bicicleta pela estrada. Fora brutalmente atropelado. Enquanto ele falava sem parar Tiago criava uma cena para o seu próximo conto. Conversaram mais um pouco até que desligou o celular deixando um pouco de tensão no ar. Ali, naquele pequeno apartamento com suas quatro paredes protetoras, Tiago encontrava não apenas abrigo físico, mas também um espaço onde podia explorar suas emoções mais profundas através da escrita. Cada história que criava era uma forma de libertação; cada personagem que inventava refletia partes dele mesmo. Era seu último refúgio—um lugar onde as revelações mais íntimas podiam surgir das sombras e onde ele poderia finalmente se reconhecer.
Ana Pujol
Enviado por Ana Pujol em 24/08/2024
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